Um esquife, forrado de brancos cetins.
Um corpo, vestido de preto, de rosto céreo,
sem expressão, anónimo sem mistério.
O invólucro daquilo que já foi alguém
mas que agora se detém frio, obscuro, ninguém.
Os rostos que me rodeiam revelam dor
pela ausência anunciada, pelos térreos fins,
pela saudade,daquele que era alvo do seu amor.
Eu observo, atenta, triste também.
Mas dentro de mim cresce uma descrença louca
de que sejamos algo mais do que aquele despojo,
que não se aceita, que não é nada, que se apouca.
E que reste algo mais de nós para alimentar o nojo,
daqueles que ficam e se mantêm alguém.
É que, para mim,
a morte é o culminar da vida,
o terminar da demora que nos foi consentida,
uma partida sem retorno, um fim.
E se alguma coisa de nós resta
é apenas a saudade e a memória.
Lembranças que alinham a nossa história
naqueles que em vida nos amaram.